Para o evangelista João, o templo de Jerusalém está superado não só por causa de um judaísmo deturpado e estéril (cf. Mc 11,20-26), mas porque Jesus veio: Ele é o Novo Templo, a tenda definitiva de Deus entre os seres humanos (cf. Jo 1,14).
Ora, o Templo de Jerusalém é resultante de um projeto humano, um desejo de Davi. O Senhor não acolhe de início o projeto do rei e, por meio do profeta Natan, o questiona dizendo que não seria Davi a lhe construir uma casa, mas, ao contrário, seria Ele a construir uma casa para o rei (cf. 2Sm 7,11b).
Na Bíblia, casa significa “habitação”, mas também “descendência”. Portanto, a palavra do Senhor comunicada ao profeta, não se referia, evidentemente, à casa feita de pedras, mas à descendência de Davi, por quem Deus estaria sempre presente em meio ao Seu povo.
O fato de o Templo de Jerusalém ter sido destruído várias vezes ao longo da história pode indicar uma dimensão muito importante: os empreendimentos humanos podem ser bons e devem existir, mas se deve ter presente também que nenhum deles, por melhor que seja, pode conter de modo exaustivo e definitivo a presença de Deus que, ao mesmo tempo em que possibilita e vitaliza os projetos históricos, os transcende.
Embora tenha sido resultado de um projeto do rei Davi, o templo de Jerusalém foi absorvido pela tradição de Israel e passou a constituir dois aspectos importantes de sua experiência religiosa: o lugar da “Presença” de Deus e ponto de convergência do povo, pois em Jerusalém terminavam todas as peregrinações dos judeus vindas de todos os rincões do país e da diáspora. Mais ainda, o profeta Isaías proclama Jerusalém como lugar de reunião de todos os povos (cf. Is 60,4).
Nessa cena da purificação, que retrata Jesus agindo com autoridade profética e manuseando os termos “templo”, “casa de meu Pai” e “santuário”, o evangelista reconhece em Jesus o Novo Templo sob o duplo aspecto, a saber: lugar da habitação da glória de Deus (cf. Jo 14,9.11) e da reunião dos povos (cf. Jo 11,51).
Quando Jesus fala da destruição e reconstrução do templo, os adversários pensam no templo de pedra, mas Jesus, acrescenta o evangelista, à luz da fé pascal, referia-se ao santuário do Seu corpo. Com efeito, a expressão “em três dias”, biblicamente, indicava um breve espaço de tempo, mas, para a comunidade cristã primitiva, evocava espontaneamente a ressurreição de Jesus, ocorrida três dias após a morte.
Com isso, o evangelista proclama que Jesus Cristo morto e ressuscitado, descendente de Davi, é o Novo Templo não construído de pedras e por mãos humanas, mas o lugar da Presença viva de Deus, “irradiação da Sua glória e perfeita expressão do Seu ser” (cf. Hb 1,3).
A purificação do templo realizada por Jesus não é, portanto, simples reforma de uma tradição corrompida, mas transformação qualitativa do “Lugar da Presença”. Não é mais em Jerusalém ou no Monte Garizin que se deve adorar a Deus, pois com Jesus, chegou o momento em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade (cf. Jo 4,21-23). É o milagre das Bodas de Caná, em que a água se transformou em vinho (cf. Jo 2,1-12). Portanto, o sinal que as autoridades judaicas exigiam de Jesus para sancionar seu ato já lhes estava dado: ali estava quem é maior que o Templo (cf. Mt 12,6).
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