Por Frei Aloísio Oliveira Em Lendo o Evangelho

“Que devemos fazer?”




A conversão é sempre concreta e vital, necessitando meios reais para que a mudança possa efetivamente ocorrer, como o demonstra o diálogo do Batista com as multidões, com os publicanos e com os soldados (3,10-14). Ao apresentarem-se a João para serem batizados, os componentes desses três grupos perguntavam: “Que devemos fazer?” A cada um o Batista respondia concretamente.

À multidão dizia para repartir as vestes e o alimento com que não tem; aos publicanos exortava a não cobrar as taxas além do preço estabelecido; e aos soldados ordenava não extorquir dinheiro à força e contentar-se com o próprio salário.

Chama a atenção o fato de João não exigir dos cobradores de impostos e dos soldados que renunciem suas atividades consideradas ilícitas, corruptas e execráveis pelo judaísmo oficial (cf. Lc 5,30). Exorta-os somente a serem honestos, não abusando de suas funções para roubar as pessoas. Isto indica que o pregador do deserto não discriminava ninguém seja pela profissão que exercia, seja por outro motivo qualquer, mas seu anúncio era dirigido a todas as pessoas na situação em que se encontrassem, desde que estivessem dispostas a praticar a fé no cotidiano, demonstrada no modo de viver.

Nos versículos 15a 18 relata-se uma discussão popular sobre a identidade messiânica de João, ou seja, pergunta-se se ele era ou não o messias esperado. Sem deixar-se levar pelas expectativas difusas, o Batista afirma ser apenas o servo indigno de desatar as correias das sandálias do Messias. Para dirimir qualquer dúvida, ele remete à diferença entre seu batismo com água para conversão dos pecados e aquele que o Messias realizará com o Espírito Santo e com fogo (3,16).

Esta expressão um tanto enigmática nos evangelhos de Marcos e Mateus, no contexto da obra de Lucas, Evangelho e Atos dos apóstolos, fica mais clara, pois, em Pentecostes, o Espírito Santo descerá sobre os apóstolos em forma de línguas de fogo (cf. At 2,1-13). Segundo o evangelista, o próprio Senhor Jesus anuncia, ainda antes da Ascensão: “João batizava com água, vós, porém, sereis batizados com o Espírito Santo dentro de poucos dias” (At 1,5; cf. 11,16). O batismo de Pentecostes, portanto, habilita os discípulos ao anúncio das grandes obras de Deus a todos os povos.

Com imagem da colheita, que remonta à tradição profética (cf. Is 27,12), o Batista apresenta a missão do Messias como realização do juízo divino: ele virá com a pá na mão para separar o trigo da palha. O trigo será recolhido no celeiro e a palha lançada ao fogo inextinguível (3,17).

O apelo do Batista à conversão constitui a base do evangelho (cf. Lc 3,18), que se desenvolverá com a vida e o ministério de Jesus (cf. Lc 5,31-32) e, portanto, permanece válido para a comunidade cristã de todos os tempos.

A conversão, aspecto fundamental da pregação de João, não é um ascetismo sem conteúdo, mas um veemente convite a acolher o primado de Deus. Não há privilégios, nem a salvação é apanágio de um grupo, de uma casta, de uma elite, mas dom gratuito de Deus quando a pessoa se torna disposta à mudança.

Escrito por
Frei Aloísio, Ministro Provincial
Frei Aloísio Oliveira

É Ministro Provincial da Província São Francisco de Assis dos Frades Menores Conventuais e especialista em Sagrada Escritura.

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