Reportagem

CF 2024 - O trabalho do Conselho Indigenista Missionário

Conheça as lutas e as dificuldades que o Conselho Indigenista Missionário combate diariamente.

Escrito por Cibele Battistini

27 FEV 2024 - 00H00 (Atualizada em 28 FEV 2024 - 06H48)

Divulgação

Arte do Encontro - uma série de entrevistas com agentes de pastorais, voluntários e comunicadores de associações abordando as diferentes categorias dentro do tema "Fraternidade e Amizade Social da Campanha da Fraternidade 2024 - "Vós sois todos irmãos".

Nesta terceira entrevista Ivanilda Torres dos Santos, secretária adjunta do Cimi nos conta os trabalhos e a situação da população indígena no Brasil

1 - Como e onde atua o Conselho Indigenista Missionário fundada e coordenada pela CNBB?

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), fundado em 1972, é um organismo da CNBB e tem como objetivo: “Testemunhar e anunciar profeticamente a Boa-Nova do reino, a serviço dos projetos de vida dos povos indígenas, denunciando as estruturas de dominação, violência e injustiça, praticando o diálogo intercultural, inter-religioso e ecumênico, apoiando as alianças desses povos entre si e com setores populares para a construção de um mundo para todos, igualitário, democrático, pluricultural e em harmonia com a natureza, a caminho do Reino definitivo”.

Nossa atuação se dá através da convivência com os povos indígenas nas suas comunidades, cultivando relações de amizade e confiança, na comunhão do cotidiano com o sagrado, do individual com o coletivo; do específico com o geral, do local com o global; alimentando a esperança, o profetismo, a mística e a militância. Nossas ações visam o fortalecimento da autonomia dos povos indígenas, na defesa de seus direitos originários e específicos à terra/território, identidades, sustentabilidade econômica, educação escolar, saúde e suas formas próprias de organização. Portanto, as linhas de ação do Cimi são focadas nos eixos: Terra, Formação, Movimento Indígena, Alianças, Políticas Públicas e Auto-sustenção.

Estamos organizados em 11 regionais em todo Brasil, com sedes coordenadas por uma coordenação Regional e as equipes de base atuando em diversos estados e municípios em todo Brasil. Em Brasília, temos o Secretariado Nacional que atua na articulação do Cimi como um todo.

2 - Qual a realidade socio econômica da hoje da população indígenas e quais são atualmente, os maiores problemas humanitários da população indígena?

Os maiores problemas vivenciados pelas populações indígenas passam pela questão territorial. O direito territorial está garantido na Constituição Federal de 1988, porém este direito não é efetivado e nos últimos anos vem sofrendo ameaças de retrocessos pelo poder Legislativo. Neste contexto, são centenas de territórios que há mais de 20 anos aguardam uma resposta do poder público em relação aos processos demarcatórios.

A terra, que na cosmovisão indígena é a base das relações sociais e espaço para o Bem Conviver, torna-se recurso a ser maximizado na lógica desenvolvimentista. Assim, diversas terras indígenas passam a ser consideradas indispensáveis para a prosperidade do agronegócio e “minério-negócio” e, por isso, conflitos e violências são praticados contra as comunidades indígenas em todos os estados da federação.

Dentre as violências estão as invasões dos territórios pelo agronegócio e por mineradoras, que levam ao desmatamento, degradação ambiental, expulsão dos povos e consequentemente um estado de vulnerabilidade extrema para muitos povos no país.

3 - Quais os projetos atuais em favor da população indígena atualmente?

Os povos indígenas por sua especificidade, têm garantidos os direitos específicos à saúde, educação, mas que pouco são efetivados na sua totalidade, com qualidade e respeito às suas especificidades. Para além dessas políticas, aos povos indígenas, também são garantidas as políticas públicas afirmativas e benefícios sociais, da mesma forma que é garantido a toda a população brasileira que se enquadra nos requisitos estabelecidos nestas políticas.

4 - População indígena e educação. Em cidades metropolitanas não se tem conhecimento da realidade indigenista brasileira. As crianças indígenas frequentam as escolas e são perfeitamente integradas?

A grande maioria da população brasileira desconhece a realidade dos povos indígenas no Brasil. Há resquícios da colonização que situa a pessoa indígena no passado, enquanto no presente estas comunidades são inviabilizadas.

Em todos os estados da federação existem populações indígenas, e não há interesse das Secretarias de Educação em ter em seus livros didáticos a história e cultura dos povos de sua região. Os livros didáticos utilizados nas escolas brasileiras não levam em conta a realidade indígena.

O censo de 2022 mostrou que aumentou o número de indígenas vivendo em contexto urbano. As escolas dessas regiões metropolitanas não estão preparadas para receber alunos provenientes de populações tradicionais. Nestas escolas, os jovens e crianças indígenas são discriminados frequentemente, tanto por alunos, quanto por muitas vezes até por professores e demais funcionários. Por isso, muitas crianças e jovens indígenas preferem esconder suas identidades.

Vale destacar que embora esses povos vivendo na cidade, não foram “integrados”. Aqui, cabe uma observação: o interacionismo foi uma perspectiva política que previa a assimilação das populações indígenas à sociedade envolvente – ou seja, no limite, uma perspectiva colonial, de apagamento das identidades destes povos. Essa perspectiva foi superada pela Constituição Federal de 1988, e essas populações resistiram à integração.

Apesar disso, muitos povos sofreram um silenciamento de suas identidades e de suas culturas. Mas essas famílias não perderam suas culturas e costumes, mesmo quando não falam mais a língua materna. Ou seja, não perderam suas identidades. As crianças indígenas frequentam sim as escolas não indígenas na cidade, porém “integrados” não estão, pois apesar delas conviverem nestes espaços, não deixaram de ser indígenas.

O censo de 2022 revelou a necessidade de se garantir políticas públicas que atendam as demandas dos povos indígenas que vivem em contexto urbano.

O Cimi tem como uma de suas prioridades atuais, a temática: indígenas em contexto urbano, que ainda é para nós desafiadora, porém necessária. Talvez seja importante pensar a escola na perspectiva intercultural, considerando a realidade indígena hoje no Brasil.

5 - Quais são os percursos de uma maior conscientização sobre a importância da população indígena em nosso país?

Dar maior visibilidade aos povos indígenas, com suas culturas, cosmovisão e resistências nas escolas, universidades, nas Igrejas, nos meios de comunicação, dando vez e voz às suas narrativas; possibilitando uma cultura de aceitação do diferente, que significa reconhecer a existência dos povos indígenas como povos originários e sujeitos de direitos. 


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