Espiritualidade

Entenda o significado da espiritualidade da Quinta-feira Santa

Neste dia, tem início o Tríduo Pascal, a preparação para a grande celebração da Páscoa, a vitória de Jesus Cristo sobre a morte, o pecado, o sofrimento e o inferno

Escrito por Angelica Lima

28 MAR 2024 - 00H00 (Atualizada em 28 MAR 2024 - 14H06)

A Quinta-feira Santa faz parte da preparação para a Páscoa. Neste dia, começa o Tríduo Pascal, quando nos preparamos mais intensamente para a grande celebração da vitória de Jesus Cristo sobre a morte e o pecado. Este é o dia em que a Igreja celebra a instituição dos grandes sacramentos da Ordem e da Eucaristia.

Em entrevista à Rede Imaculada de Comunicação, o bispo de Limoeiro do Norte, no Ceará, Dom André vital Félix da Silva sobre as celebrações desta data. Confira:

Dom André vital, qual é a mensagem central desses dias que antecedem a Páscoa?

É, antes de tudo, lembrar aquilo que certamente quem é cristão católico sabe, que o centro da nossa fé é o mistério Pascal. Nós só somos cristãos porque acreditamos que Jesus, o filho de Deus, se encarnou e que a sua morte é precedida de tanto sofrimento, de tanta paixão, e a sua ressurreição constitui a razão de nós acreditarmos nele, e de seguirmos os seus passos. Então, nós diríamos que no centro de tudo está esse mistério do Cristo morto e ressuscitado, e que a igreja celebra todos os dias do ano. Não tem um dia sequer que a igreja não celebre este mistério. E neste tempo da Quaresma, se faz uma preparação para a celebração deste mistério Pascal. Então nós temos dois motivos principais: primeiro, de ordem didática. O ser humano, ele precisa de meios, de ajuda, para poder assimilar um conteúdo muito denso, que é justamente o significado da Paixão, da Morte e Ressurreição de nosso Senhor Jesus Cristo. E o outro motivo é de ordem teológica, isso porque sem este caminho de assimilação, de aproximação deste grande mistério do amor de Deus revelado no seu filho, nós não podemos encontrar sentido para a nossa vida cristã. Então, todo o ano litúrgico é celebração do Ministério Pascal, mas a igreja dispõe para nós, de forma muito didática e pedagógica, os vários tempos litúrgicos. Porém, não há uma diferença essencial, mas há uma diversidade enriquecedora do modo de celebrar o mesmo mistério. Então, diante dessa pergunta, qual é a mensagem central desses dias? A mensagem central é aquela de sempre, Deus nos ama e porque nos ama, enviou o seu filho para que nós tenhamos vida e vida em abundância.

Dom André vital, quando, especificamente, termina a Quaresma? o Tríduo Pascal está dentro do tempo da Quaresma?

Há pouco nós falamos sobre esse dispositivo pedagógico e didático que a igreja utiliza, sobretudo na organização da sua liturgia. Tem também um caráter simbólico. Para a liturgia, o número não se restringe a uma quantidade, mas o número tem um aspecto simbólico, porque indica uma vivência. Claro que a gente não pode separar, quando eu falo 40 dias de uma quantidade, mas na verdade, quando eu estou falando 40 dias, eu estou falando de um tempo que deve propiciar, favorecer uma experiência. E isso a partir de quê? A partir de uma longa tradição. Então, quando nós abrimos a bíblia, nós vamos encontrar muitos eventos, acontecimentos, situações, na sagrada escritura, na vida do povo de Deus, marcados justamente por esse aspecto simbólico de 40, de 4, de 400. A base é o número 4, porque o número 4 indica, de um modo muito simples, o tempo de preparação ligado à experiência humana. Então, quando nós falamos do número 3, nós relacionamos à divindade, à Trindade, ao eterno, enquanto que o número 4 está muito ligado ao temporal, aquilo que é a experiência humana e assim por diante. E, claro, temos razão para isso. Não é arbitrário. Não é só porque alguém definiu isso, mas é a partir de uma experiência profunda, também de percepção da realidade, que a gente vai elaborando essa linguagem simbólica. Então, por que a Quaresma dura 40 dias? Porque 40 dias lembramos o episódio do dilúvio já no início do livro do Gênesis. O próprio povo de Deus que vai peregrinar durante 40 anos pelo deserto. O próprio Jesus, durante 40 dias se prepara para a sua missão, e assim por diante. Então, o número 40 é um número que vai para além de uma questão de quantidade, mas de um momento de preparação. Então, se a gente leva em consideração isso, começando a Quaresma na Quarta-feira de Cinzas, nós vamos terminar a Quaresma na Quinta-feira Santa. Mas, alguém pode perguntar: “mas, na Quinta-feira Santa não começa o Tríduo Pascal?” Sim e não. Porque o Tríduo Pascal começa às vésperas da Sexta-feira, que na contagem simbólico litúrgica já é a sexta-feira. Por isso que, para nós, por exemplo, sábado à tardinha, à noite, já é celebração dominical, porque há essa maneira de apresentar o dia já ou as suas vésperas e, portanto, o tempo da Quaresma, ele se encerra, como diz a igreja, daí a gente fala a linguagem oficial, se encerra na Quinta-feira Santa, antes da missa da Ceia do Senhor. Portanto, Quaresma vai até a Quinta-feira, até a missa da Ceia do Senhor Exclusive, ou seja, até começar a missa é o tempo da Quaresma. Quando nós começamos a missa da Ceia do Senhor, então entramos no Tríduo Pascal, que é também de preparação, e ao mesmo tempo já é celebração desse mistério Pascal.

Então, a missa do crisma, onde os bispos e arcebispos se reúnem em celebração com os padres da diocese, onde é abençoado o óleo, isso então não entra no Tríduo Pascal? Esta celebração é dentro da Quaresma?

De novo a gente vai para um aspecto complexo também da liturgia, porque nessa missa do crisma existe um aspecto de solenidade até esse canta o Glória e assim por diante. Porém, é uma missa que está em vista daquilo que à noite nós vamos celebrar, que é o sacerdócio e a Eucaristia. A eucaristia está ligada intimamente com o sacerdócio. Sem o sacerdócio não há eucaristia, o sacerdócio ministerial e, portanto, a celebração desta missa de manhã é justamente para deixar muito claro que o Cristo sacerdote institui o sacerdócio e a eucaristia.

Nós já aprendemos muito sobre a celebrações da Quinta-feira Santa, mas o que que ela significa para a Igreja Dom André? O que celebramos neste dia?

Nós já falamos da parte da manhã, agora pensando na parte da tarde, porque a missa chamada Missa da Ceia do senhor é prescrita para ser celebrada nas horas vespertinas, isto é, à tardinha, à noite. Então, nesta celebração, nós evidenciamos três coisas fundamentais: a primeira é a instituição do sacerdócio, porque sem ele não há Eucaristia, e sem Eucaristia não há sacerdócio; a instituição da Eucaristia; e o terceiro elemento também destacado nesta celebração, é a instituição do mandamento do amor e do serviço, por isso o gesto de lava pés. Esses três elementos são bem evidenciados nesta celebração que nós chamamos a Ceia do Senhor.

“O rito do lava pés tem aspecto simbólico. Se não foi uma instituição, então, até certo ponto, não é obrigatório, mas, faz parte da natureza daquela celebração evidenciar o mandamento do amor e do serviço.”


Dom André, fale sobre a celebração da noite. Qual o significado do rito do lava pés? Ele sempre tem que acontecer nesta missa?

O lava-pés não foi instituído por Jesus como a Eucaristia, porque se assim fosse, toda vez que a gente celebrasse a Eucaristia teria obrigação de fazer o lava-pés. Então, Jesus não instituiu um rito. Ele realizou um gesto, e esse gesto é síntese de toda a sua vida, que é serviço e, portanto, nós não podemos transformar esse gesto em simples dramatização. Mas, nós devemos considerar o gesto como algo que nos chama atenção e nos ensina que a nossa vida deve ser um serviço. O gesto foi lavar os pés porque, no contexto de Jesus, era aquilo que o servo deveria fazer. É simbólico, mas ele não é normativo. Jesus não mandou que a gente lavasse os pés. O gesto que, historicamente se enraíza numa prática, mas ele não se torna uma espécie de modelo para que seja repetido. O rito tem aspecto simbólico. Se não foi uma instituição, então, até certo ponto, não é obrigatório, mas, faz parte da natureza daquela celebração evidenciar o mandamento do amor e do serviço.

Depois da celebração da missa de Quinta-feira à noite, se desnuda o altar e o sacerdote faz o translado da Eucaristia. Gostaria que o senhor explicasse este rito e nos dissesse como nós, cristãos, podemos viver este dia de celebração.

Além da própria celebração da missa, há um momento de prolongamento, que é o momento da adoração, com algumas orientações e normativas bem concretas, por exemplo, quando se conclui a distribuição da comunhão, nós temos uma reserva eucarística. As hóstias consagradas que ficaram nós guardamos. Essa reserva Eucarística é colocada em outro lugar, não onde geralmente está o sacrário, mas em um altar preparado. Também não é permitido colocar o Santíssimo no ostensório, nem fazer uma procissão como Corpus Christi, assim por diante, porque não é a procissão do Santíssimo, é a transladação do Santíssimo, ou seja, levar o Santíssimo para o outro lado. E ali nós recordamos também fatos históricos. Então, quando Jesus termina a ceia, ele vai para o Jardim das Oliveiras, o Horto, e passa a noite ali, em oração, no sofrimento. Toda aquela situação que nós conhecemos pelo evangelho, então isso também seria para nós, cristãos, vivenciarmos este momento de Jesus. Neste momento também se faz o desnudamento do altar. Este momento é para nos recordar também esse esvaziamento de Cristo, esse despojamento de Jesus. A liturgia é muito rica. A liturgia não é um conjunto de ações folclóricas, mas sim uma vivência, um mergulhar nesse mistério da vida de Cristo, da sua paixão, da sua morte, da sua ressurreição.

Seja o primeiro a comentar

Os comentários e avaliações são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião do site.

0

Boleto

Reportar erro!

Comunique-nos sobre qualquer erro de digitação, língua portuguesa, ou de uma informação equivocada que você possa ter encontrado nesta página:

Por Angelica Lima, em Espiritualidade

Obs.: Link e título da página são enviados automaticamente.