Por Frei Aloísio Oliveira Em Lendo o Evangelho

A força da humildade do Reino de Deus

No Evangelho (Mc 4,26-34) deste domingo (13), Frei Aloisio fala sobre a parábola da semente lançada na terra para germinar, como a Palavra de Deus em nossos corações.

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Vamos lançar as sementes do evangelho


Este trecho compõe-se de duas parábolas: a da semente lançada na terra (Mc 4,26-29) e a do grão de mostarda (Mc 4,30-34). Na primeira, Jesus diz que o Reino dos céus é como a semente que um homem lançou na terra e que sem ulterior intervenção dele nasce e cresce sem que saiba como (cf. Mc 4,26-27). A passividade do lavrador contrasta com a atividade da terra que, por si mesma, produz o fruto (cf. Mc 4,28).

Tendo-se presente a parábola do semeador (Mc 4,1-20), terra, aqui, significa a “terra boa” e representa as pessoas que não resistem à Palavra, mas ao contrário, dando-lhe plena acolhida a fazem frutificar em suas vidas (cf. Mc 4,20).

Portanto, a semeadura, a germinação da semente e o crescimento da planta correspondem à assimilação interior da Palavra, por parte do ouvinte, a produção e maturação dos frutos à transformação que tal assimilação produz (cf. Mc 4,28-29).

Contudo, a maior beleza e ousadia do texto é afirmar a conaturalidade entre o ser humano e a Palavra. Pois, levando-se em conta que a semente é a Palavra (cf. Mc 4,14) e a “terra boa” é o ouvinte que a acolhe, possibilitando que ela produza abundância de frutos (cf. Mc 4,20), significa que o ser humano e a Palavra são feitos um para o outro.

Não há exceções: em contato com esta semente, a terra boa frutifica sempre. Portanto, a força vital contida na Palavra é atualizada pela receptividade que encontra no próprio ser humano. Destarte, se não houver o encontro entre o ser humano e a Palavra, a relação de complementaridade entre eles fica frustrada, pois semente sem terra que a receba não produz fruto. A Palavra precisa, portanto, do ouvinte obediente que a traduza em gestos. Só assim ela pode frutificar.

A descrição do desenvolvimento da planta: primeiro aparece a erva, depois a espiga e por fim, a espiga cheia de grãos (cf. Mc 4,28b) quer dizer que a transformação do ser humano não é coisa de um dia. É necessário um caminho gradual de conversão.

Quando a planta segue seu processo natural de desenvolvimento o fruto amadurece e a colheita abundante se apresenta como um dom (cf. Mc 4,29). De igual modo, quando o cristão percorre seu caminho de escuta atenta da Palavra, confrontando-se com ela, os frutos de conversão vão acontecer em sua vida como o dom de uma colheita generosa em que ele mesmo vai ser o fruto. Portanto, o fruto maduro é o discípulo mesmo crescido e amadurecido no seguimento de Jesus Cristo até tornar-se pleno de Seu Espírito e ser capaz de uma doação semelhante à dele.

Com a parábola do grão de mostarda (Mc 4,30-34), Jesus declara que toda referência ao exclusivismo de Israel e suas expectativas messiânicas triunfais foram abolidas. O Reino de Deus é algo novo, uma comunidade humana de começos insignificantes e que, inclusive em seu máximo desenvolvimento, será desprovido de esplendor mundano.




Esse foi, certamente, um dos aspectos da pregação de Jesus sobre o Reino de Deus que mais desafiava a compreensão de seus concidadãos, pois o privilégio de Israel como destinatário exclusivo da salvação estava indelevelmente arraigado na memória coletiva. Todo o judaísmo estava impregnado de ideais nacionalistas, ansiando pela derrocada da dominação estrangeira e pelo triunfo sobre os povos pagãos estabelecendo a supremacia definitiva de Israel no mundo. Tal esperança caracterizava tão fortemente a alma popular que Jesus não podia expor abertamente o conteúdo da parábola, sem correr grave risco de rejeição definitiva de sua pessoa e de sua mensagem. Por meio da parábola, tal conteúdo é insinuado, permanecendo na sombra seu sentido pleno.

A imagem dos pássaros que se aninham à sombra da árvore de mostarda descreve a atração que o Reino de Deus exerce sobre todas as pessoas de todas as etnias. É o anseio por um estado de paz em que todos, independentemente de qualquer diferença, queremos repousar. Tal paz, porém não se alcança pela força de um poder imposto, mas somente pela humilde e livre comunhão de Espírito.

Em suma, ambas as parábolas afirmam que a chegada do Reino de Deus não acontecerá de improviso por uma intervenção divina extraordinária nem pela observância exaustiva da Lei de Moisés e nem por revolução violenta, como pensavam certos contemporâneos de Jesus. O Reino de Deus requer certamente a colaboração humana, mas pressupõe a transformação dos indivíduos que, acolhendo a Palavra do Evangelho, se deixam contagiar pela sua força de fermentação. Assim, o inesperado acontece: inexplicavelmente, uma semente lançada no silêncio da terra produz fruto abundante e outra sementinha minúscula e insignificante transforma-se em árvore frondosa.

Escrito por
Frei Aloísio, Ministro Provincial
Frei Aloísio Oliveira

É Ministro Provincial da Província São Francisco de Assis dos Frades Menores Conventuais e especialista em Sagrada Escritura.

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