A cura do cego de Jericó dá-se no contexto do ensinamento de Jesus a seus discípulos sobre Sua paixão e morte (cf. Mc 8,27‒10,52). O cego, portanto, representa o próprio grupo dos discípulos que devem deixar que Jesus lhes abra os olhos por Seu ensinamento.
A cegueira deles e a necessidade de cura foram demonstradas, pouco antes (cf. Mc 10,37), pela incompreensão manifestada no pedido pelos primeiros lugares feito por Tiago e João, mesmo depois do terceiro anúncio de Sua paixão e morte (cf. Mc 10,33-34). A situação deles é a de quem “mesmo vendo não percebem” (cf. Mc 4,12; 8,18).
A passagem toda está centrada na pessoa de Jesus e no seguimento d’Ele. O cego que, mesmo sem poder ver, se informa que Jesus está passando e, não obstante as repreensões dos circunstantes, Lhe grita por socorro, representa o discípulo que, na situação concreta em que vive, busca seguir Jesus, enfrentando resistências e dificuldades.
A fé que salvou o cego (cf. Mc 10,52a) é a adesão a Jesus e a confiança n’Ele. Jesus não o tocou, mas a adesão realizou o contato. Com isso, o evangelista que fala a uma comunidade cristã, que vive cerca de quarenta anos depois da morte de Jesus, pretende afirmar que, embora não podendo mais ter o contato físico com Ele, como os discípulos da primeira hora, os cristãos de todos os tempos podem ser curados de sua cegueira e incompreensão pela adesão autêntica a Jesus, viabilizada pela escuta atenta do Evangelho.
O gesto de o cego lançar fora a veste e dar um salto para ir até Jesus, respondendo a Seu chamado, significa a ruptura com a vida que levava antes e a adesão completa ao seguimento de Jesus, em Seu caminho (cf. Mc 10,52b). Com isso, o evangelista afirma que o discípulo que decide cumprir as condições do seguimento muda sua escala de valores baseada em privilégios e prestígio social (cf. Mc 10,37) e aceita ser último e servidor de todos (cf. Mc 9,35), deixando para trás “a forma de pensar dos homens” para aderir “à forma de pensar de Deus” (cf. Mc 8,33). Essa é a cura da cegueira que torna o olho sadio qual verdadeira lâmpada do corpo, que deixa toda a vida iluminada (cf. Mt 6,22).
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