O peruano faleceu há quase um ano. O livro, traduzido do espanhol para o italiano por Marta Pescatori, foi publicado pela Editora Queriniana.
Publicamos trechos do prefácio do Papa Francisco ao livro “Vivir y pensar el Dios de los pobres” (Viver e pensar o Deus dos pobres), a última obra de Gustavo Gutiérrez (1928-2024) publicada postumamente sob curadoria de Leo Guardado. O livro, traduzido do espanhol para o italiano por Marta Pescatori, foi publicado pela Editora Queriniana (Brescia, 2025, 368 páginas, 42 euros).
Gustavo Gutiérrez, durante a sua longa vida, foi um servo fiel de Deus e um amigo dos pobres. A sua teologia marcou a vida da Igreja e ainda é atual, com um frescor que abre caminhos ao seguimento de Jesus. Alegramo-nos com a publicação deste livro, Viver e pensar o Deus dos pobres. Com a sua morte, eu disse: “hoje penso em Gustavo, Gustavo Gutiérrez. Um grande, um homem de Igreja que soube calar quando devia calar, que soube sofrer quando devia sofrer e que soube dar tantos frutos apostólicos e uma teologia tão rica”. Neste último livro, Gustavo nos presenteia mais uma vez com o fruto do seu empenho, da sua oração e da sua reflexão. Quero destacar nessas páginas a profunda e permanente fidelidade à Igreja em seu caminho. Uma fidelidade vivida com humildade, às vezes com dor e, fundamentalmente, com liberdade. Já nos Anos 60, as inquietações teológicas de Gustavo estavam gradualmente emergindo através da sua história pessoal, dos seus estudos e do seu trabalho pastoral.
Uma nova era se iniciou com aquele imenso sopro do Espírito que foi o Concílio Vaticano II, em cuja quarta sessão acompanhou, como jovem teólogo, o cardeal Juan Landázuri Ricketts, arcebispo de Lima. O impulso conciliar e os textos que o expressavam ofereceram um terreno sólido sobre o qual se basear e horizontes abertos para reorientar o trabalho pastoral a partir da realidade de um território como a América Latina. Muitos grupos cristãos estavam vivendo desafios, questionamentos e esperanças que derivavam do forte clamor dos pobres e do crescente compromisso com este mundo. “A irrupção dos pobres”, como Gustavo a chama, exigia justiça e uma outra maneira de viver a fé, de pensar a fé, de dizer a fé, em suma, de ser Igreja. Gustavo frequentemente lembrava, oralmente e por escrito, a frase de João XXIII de 11 de setembro de 1962, um mês antes da inauguração do concílio: “a Igreja se apresenta como é e quer ser, como a Igreja de todos e, particularmente, a Igreja dos pobres”; e também, já na sala conciliar, a insistência na mesma linha do cardeal Giacomo Lercaro. A evolução do concílio ofereceu modelos fundamentais nessa perspectiva, mas, no final, esse sonho de uma Igreja dos pobres permaneceu um horizonte a ser alcançado. O Pacto das Catacumbas, assinado por um grupo de padres conciliares, muitos dos quais latino-americanos, assumiu essa orientação espiritual, teológica e pastoral. A Igreja na América Latina abriu os braços ao concílio de maneiras diferentes, mas é muito claro que em todos os países e em todos os âmbitos eclesiais houve pessoas e grupos — de leigos, religiosos, presbíteros e bispos — que acolheram a letra e o espírito do Vaticano II com entusiasmo e dedicação. Uma prova válida disso é a II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano (Medellín, 1968), com São Paulo VI que pisou nessas terras.
Entre aqueles que prepararam e acompanharam Medellín estava Gustavo, que trabalhava dia e noite. Gustavo, outros teólogos e pastores e muitos bispos, já em espírito sinodal, teceram em torno daquela experiência eclesial uma rede de confiança e amizade que favoreceu decisões pastorais, documentos e reflexões teológicas: eles marcaram, e continuam marcando, a identidade eclesial da América Latina e do Caribe. Na III Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, realizada em 1979, o nosso querido Gustavo esteve muito presente tanto nos debates anteriores quanto durante o desenrolar da conferência na cidade de Puebla, no México.
Gustavo manteve uma clara linha de continuidade com Medellín, muito atento à realidade social e eclesial, lembrando sempre que a opção pelos pobres é evangelicamente central entre as antigas e novas pobrezas. (...) Somente com os rostos dos pobres no centro encontraremos um terreno comum sobre o qual nos reconhecermos mutuamente na Igreja, no encontro com as culturas em que se desenvolve nossa vida de fé, no cuidado da criação e no diálogo ecumênico e interreligioso.
Toda a reflexão de Gustavo nos chamou a estar atentos às inegáveis mudanças do nosso tempo, muitas das quais positivas para a humanidade, até mesmo fascinantes, mas que tantas vezes escondem ou mascaram o que há de mais cruel e desumano em nossa realidade universal.
A sua pergunta constante, “Como podemos falar de Deus a partir do sofrimento do inocente?”, continua sendo premente para os crentes diante do poder da injustiça e da mentira. Os pontos centrais da sua teologia querem estar presentes onde a marca de Deus parece ter sido apagada na atmosfera cultural. Enraizada na libertação que Cristo nos oferece, a sua teologia afirma a gratuidade do amor de Deus que nos envolve na história.
A teologia de Gustavo permanece na Igreja não como um belo tesouro do passado, mas como aquele “segundo ato”, uma tarefa sempre aberta, para pensar a nossa experiência vivida de Deus; uma experiência já iniciada e experimentada justamente ali onde nos tornamos próximos dos feridos, abandonados à beira da estrada, e de onde tentamos dizer com humildade, com terna convicção, aos mais pobres e a todos: “Deus te ama”. Gustavo nos deu as ferramentas teológicas indispensáveis para que nunca nos esquecêssemos dos pobres.
Neste último livro, ele deixa muito claro que lembrar-se dos pobres significa muito mais do que uma coleta; não é um acréscimo piedoso.
Como ensina Paulo, é o coração da mensagem (2 Coríntios 8–9). Em consonância com este texto, convém evocar as palavras de uma pessoa muito querida a Gustavo, Bartolomé de Las Casas: «De cada um dos pequenos e mais esquecidos, Deus guarda uma recordação muito próxima e viva». A partir daqui, o Reino que Jesus anuncia abraça toda a criação, cada ser humano e realidade humana, em todos os tempos e lugares. Este é o Deus de Jesus.
Fonte: L'Osservatore Romano
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