A biografia de um pastor

Professor Doutor Fernando Altemeyer Junior, assistente doutor do departamento de Ciências Sociais da PUC-SP

Joseph Aloysius Ratzinger, o Papa Bento XVI, faleceu no último dia de 2022, às 9h34, na residência do Mosteiro Mater Ecclesiae, na cidade do Estado do Vaticano, com 95 anos de idade. Nascido em Marktl am Inn, na Baviera, diocese de Passau, na Alemanha, em 16 de abril de 1927. Seu pai, Joseph Ratzinger, era comissário de polícia e provinha de família de agricultores da Baixa Baviera, de condições econômicas modestas. A mãe, Maria Peintner, era filha de artesãos de Rimsting, no lago de Chiem, e antes de casar trabalhou como cozinheira em hotéis. Transcorreu a sua infância e a sua adolescência em Traunstein, uma pequena cidade perto da fronteira com a Áustria, a cerca de trinta quilômetros de Salzburg. Ratzinger recebeu neste contexto "mozarteano", digamos assim porque era permeado pela música de Mozart, a sua formação cristã, humana e cultural. A fé e a educação da sua família preparam-no para a dura experiência dos problemas relacionados com o regime nazista: ele recordou ter visto o seu pároco ser açoitado pelos nazistas antes da celebração da Santa Missa e ter vivido na pele o clima de grande hostilidade em relação à Igreja católica na Alemanha pelo regime nazista. Quase ao final da tragédia da Segunda Guerra Mundial também foi alistado nos serviços auxiliares antiaéreos.

De 1946 a 1951 estudou filosofia e teologia na Escola Superior de filosofia e teologia Herzogliches Georgianum, de Freising e na Universidade de Munchen. Foi ordenado diácono em 1950, e em 29 de Junho de 1951, festa de São Pedro e São Paulo, foi ordenado presbítero junto ao irmão Georg pelo cardeal Michael von Faulhaber, na catedral de Freising. Um ano depois, padre Ratzinger inicia sua atividade didática na mesma escola onde tinha sido estudante. Se tornou um conferencista eminente aos 25 anos. Em julho de 1953 doutorou-se em teologia com uma dissertação sobre o tema: "Povo e Casa de Deus na Doutrina da Igreja de Santo Agostinho. Em 1957 apresentou a livre docência sobre: "A teologia da história em São Boaventura". Tornou-se professor universitário aos 31 anos.

A partir de 1969 assumiu como professor de dogmática e história dos dogmas na Universidade de Regensburg - Ratisbona, desempenhando os cargos de decano e Vice-Reitor da Universidade. A sua intensa atividade acadêmica levou-o a desempenhar importantes cargos no âmbito da Conferência Episcopal Alemã e na Comissão Teológica Internacional. Entre as suas publicações, teve particular eco o livro intitulado "Introdução ao cristianismo", publicado em 1968, uma coletânea de lições universitárias sobre a "profissão de fé apostólica". Em 1973, foi publicado: "Dogma e Revelação", que reúne os ensaios, as meditações e as homilias dedicadas à pastoral. Publicou o "Relatório sobre a fé" em 1985 que teve impacto mundial. E o livro "Na escola da Verdade", em seu septuagésimo aniversário. A lista das publicações antes do pontificado chegou a 600 artigos e escritos teológicos.

O professor Ratzinger participou como perito teológico no Concílio Vaticano II. Foi um dos fundadores da Revista Concilium e da revista teológica internacional Communio. 1977 o Papa São Paulo VI o nomeou arcebispo de Munchen e Freising, quando tinha 50 anos. Recebeu a ordenação episcopal em 28 de maio de 1977, sendo o primeiro sacerdote diocesano ordenado, depois de oitenta anos, a assumir o governo pastoral da diocese bávara. Escolheu como lema episcopal: "Cooperadores da Verdade". O santo Papa Paulo VI fez dele cardeal com o título de Santa Maria Consoladora no Tiburtino, pelo Consistório de junho de 1977.

O Cardeal Ratzinger foi relator na Quinta Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, em 1980, sobre o tema da Família cristã no mundo contemporâneo. Também foi Presidente da Sexta Assembleia, em 1983, com o tema da reconciliação e penitência na missão da Igreja. Em 1981, aos 53 anos, o Papa João Paulo II nomeou-o Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé e presidente da Pontifícia Comissão Bíblica e da Comissão Teológica Internacional. Em 1998 foi nomeado vice-decano do Colégio Cardinalício e em 2002 tornou-se Decano, tomando posse do título da Igreja Suburbicária de Óstia. Membro do Conselho da II Sessão da Secretaria de Estado; das Congregações para as Igrejas Orientais, do Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, para os Bispos, para a Evangelização, para a Educação Católica; do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos; da Pontifícia Comissão para a América Latina e da Pontifícia Comissão "Ecclesia Dei". A ele foram confiadas as meditações da Via-Sacra de 2005 celebrada no Coliseu. Logo após a Páscoa daquele ano, o Papa João Paulo II faleceu aos 85 anos. O Cardeal Ratzingher presidiu os funerais do Papa e conduziu os cardeais presentes no conclave que tinham o dever que escolher um novo Papa.

Em 18 de abril de 2005, Cardeal Ratzingher foi anunciado como novo Papa e adotou o nome de Bento, o 16º a escolher o mesmo nome do padroeiro da Europa, São Bento de Núrsia. “Depois do grande Papa João Paulo II, os Senhores Cardeais elegeram-me, simples e humilde trabalhador na vinha do Senhor”, disse o Papa emérito ao ser escolhido.

O Papa Bento XVI surpreendeu o mundo ao anunciar sua renúncia em fevereiro de 2013. Na sua última audiência geral, diante dos fiéis na praça de São Pedro, no Vaticano, fez questão de explicar suas motivações para a renúncia e se expressou com honestidade dizendo que "amar a Igreja significa também ter a coragem de fazer opções difíceis, árduas, tendo sempre em vista o bem da Igreja e não nós mesmos"